Em um cenário onde o empreendedorismo é visto como motor de recuperação econômica pós-pandemia, Pernambuco surge como um dos destinos menos atrativos para quem sonha em abrir um negócio no Brasil.
De acordo com análise recente do Índice de Cidades Empreendedoras (ICE), produzida pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap) e fundamentada em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o estado ocupa a quinta pior posição no ranking nacional para o desenvolvimento de empreendimentos, principalmente devido a deficiências graves em infraestrutura urbana e logística.
O ranking, divulgado na última semana, avalia 101 municípios mais populosos do país em sete pilares fundamentais: ambiente regulatório, infraestrutura, mercado, capital financeiro, inovação, capital humano e cultura empreendedora. Pernambuco, representado majoritariamente por Recife e municípios como Jaboatão dos Guararapes e Olinda, pontua baixo especialmente no quesito infraestrutura – que inclui pavimentação, acessibilidade, transporte e conectividade –, com uma nota média de 42 pontos em uma escala de 100. Isso coloca o estado atrás apenas de Ceará, Piauí, Maranhão e Alagoas, todos do Nordeste, reforçando a disparidade regional no ecossistema de negócios brasileiro.
Os dados do IBGE, extraídos do Censo Demográfico 2022 e atualizados com pesquisas complementares de 2024, pintam um quadro preocupante. Em Pernambuco, 23,68% dos 7,4 milhões de moradores de áreas urbanas – cerca de 1,7 milhão de pessoas – ainda vivem em ruas sem pavimentação, o que compromete o escoamento de águas pluviais, aumenta riscos de acidentes e eleva custos logísticos para pequenos empreendedores.
No quesito acessibilidade, o estado é o segundo pior do país: apenas 8,48% da população urbana reside em vias com calçadas livres de obstáculos, como buracos, postes ou construções irregulares, segundo o Censo.
“Essa falta de infraestrutura não é só um problema de mobilidade; é um entrave direto ao empreendedorismo”, afirma João Silva, economista e consultor do Sebrae-PE. “Imagine um delivery ou um e-commerce tentando operar em Recife com ruas esburacadas e sem sinalização para bicicletas.
Os custos sobem, os prazos atrasam e o investidor foge.” Silva cita que, em 2024, o estado registrou um aumento de 15% nas reclamações de empreendedores sobre logística urbana, via plataforma do Procon-PE.
Outro gargalo é a circulação de veículos: 11,9% dos pernambucanos vivem em ruas exclusivas para carros ou vans, enquanto 8,42% dependem apenas de modais não motorizados, como pedestres ou motos.
Isso reflete uma malha viária defasada, com apenas 76,32% das vias pavimentadas – bem abaixo da média nacional de 85%. Comparado a líderes como São Paulo (nota 78/100 no pilar infraestrutura), Pernambuco perde em conectividade rodoviária e proximidade a portos eficientes, apesar do potencial do Porto de Suape.
O efeito cascata é evidente nos números. Segundo o IBGE, o número de novas empresas abertas em Pernambuco caiu 8% em 2024 em relação a 2023, contrastando com o crescimento de 12% em estados como Santa Catarina e Paraná, que lideram o ranking de competitividade do Centro de Liderança Pública (CLP) 2025.
No Nordeste, o Ceará desponta como o pior do país no Índice FIEC de Inovação, com queda de sete posições em empreendedorismo desde 2020, atribuída a gargalos semelhantes em infraestrutura.
Pernambuco, embora não o último, segue a tendência regional: Norte e Nordeste concentram 70% das piores pontuações no ICE.
O governo de Pernambuco reconhece o problema. Em nota, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo (Sedet) afirmou que “investimentos de R$ 2 bilhões em infraestrutura urbana estão previstos para 2026, com foco em pavimentação e mobilidade sustentável”.
No entanto, especialistas cobram ações imediatas. “Precisamos de PPPs (parcerias público-privadas) para modernizar o transporte, como em Fortaleza, que subiu no ranking graças a melhorias em rodovias”, sugere o presidente da Fiepe (Federação das Indústrias de Pernambuco), Murilo Cavalcanti.
Do lado federal, o Ministério da Infraestrutura anunciou R$ 250 bilhões em concessões para 2025, incluindo rodovias no Nordeste. Mas, para o CLP, sem reformas locais em burocracia e tributação, os efeitos serão limitados. “Pernambuco tem potencial turístico e agroindustrial, mas sem base sólida, o empreendedorismo vira roleta-russa”, alerta o relatório.
O alerta é claro: sem investimentos urgentes, Pernambuco arrisca perder não só empreendedores, mas o bonde do crescimento econômico. Como disse um empresário recifense anônimo: “Aqui, o sonho de empreender vira pesadelo nas primeiras chuvas.” Resta saber se os dados do IBGE serão o catalisador para mudança – ou apenas mais um capítulo de descaso regional.